Apologia à sabiá-laranjeira


















Apologia à sabiá - laranjeira

Essa luz que me invade não é o bastante
para amainar a angústia que me traspassa
Nem o chilreio caótico dos pardais
quer me traduzir o desejo de um bom dia.
Bom -dia, dia luzente!
Mesmo que a mim me pareça
que todos os dias são iguais:
monótonos e sombrios dias
em cujas horas hei de vagar, apático,
com a carapaça que travisto.
Pela janela que, como solícitos braços,
abre-se ao parco verde
de raras árvores de pouca fronde
umas aquí, outras acolá,
penetram, misturados à balbúrdia pardálica,
maviosos acordes alentadores.
É minha amiga sabiá - laranjeira
arguta conselheira
que, cotidianamente, nesses dias primaverís,
desperta - me com seu canto
como a querer dizer - me:
- Bom -dia, prisioneiro! Desperta para a vida!
Sim, amiga sábia...
tu, como eu, sabes que sou enclausurado
em meu próprio espírito
embora tenha me concedido Hábeas Corpus
para satisfazer alheias alegrias.
Tu, que tens do céu a garandeza como universo
e que tens por pasto a natureza,
não necessitas que te apoquentes com a psique
para que não morras de taquicardia,
a não ser que cuides para que não caias
em desumanas humanas armadilhas
e não te tornes, como eu, prisioneira.
Vai! E que o bater de tuas asas
conduza teu harmonioso cantar
a tantos quantos como eu, desajustados,
nele se façam confortar.
Vai, amiga sabiá!
Já me confortaste
e outros carecem do mesmo alento;
vai e sejas feliz, irradiando felicidade
nessa tua etérea passagem.
Quando aquí já não mais pousares
e teu canto se tornar silêncio,
ainda assim estarei te ouvindo;
e, mesmo os que não tiveram a minha sorte
de partilhar a tua cantante alegria,
ouvirão de mim, falar de ti algum dia.
Vai! Eu te desejo um bom - dia!

Italmar Menezes

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